Naquela sexta feira, tudo parecia tranquilo, a rodovia era de uma calmaria incomum a uma sexta feira de feriado prolongado. O rádio da Central de Controle pouco nos perturbava com acionamentos, seja para atendimentos comuns como para acidentes. Lembro-me que já passavam das 18:00h quando chegou pela base um senhor em desespero. Lembro-me que ele trajava uma calça na cor verde e uma jaqueta de motociclista na cor vermelha e por ela distribuído várias propagandas destas que patrocinam esportes automobilísticos. Aos gritos aquele senhor pedia ajuda para que socorrêssemos sua família, pois, ele conduzia um veículo de passeio e havia se perdido numa curva logo ali perto nas proximidades de Londrina e Ibiporã no norte do Paraná e sua esposa com sua filha de 4 anos ainda estavam presas nas ferragens. Como de costume o condutor da ambulância a quem chamamos de resgatista informou a central via rádio e na companhia daquele senhor iniciamos o deslocamento para o local do acidente. Durante o percurso o pai aflito fazia suas orações, pedia para que andássemos mais rápido e implorava para que salvássemos a vida de seus entes. Ao abrirmos a curva, lá estava o cenário do acidente. As imagens eram desoladoras, um carro que se quer dava para identificar a marca ou modelo, e ainda sobre o banco dianteiro do passageiro a mãe abraçada com a filha agonizavam a espera do atendimento. Lembro-me ainda que mal a ambulância havia parado eu já me encontrava com o colar cervical nas mãos e abordando as vítimas. Meu parceiro se preocupava com a sinalização enquanto aquele pai nos ajudava com os procedimentos. Logo chegaram outras viaturas de apoio, e com elas a polícia rodoviária. O carro foi cortado, a ferragem retirada de sobre as vítimas, todos os protocolos de resgate cumpridos a risca enquanto aquele senhor continuava ao nosso lado apoiando no socorro. Vias aéreas desobstruídas, cervical devidamente preservada, hemorragias estancadas, neurológico das vítimas mantidas sob controle, veias puncionadas com volume e imobilização padrão. Com o apoio dos terceiros e principalmente daquele pai as duas vítimas estabilizadas foram encaminhadas ao interior da ambulância. Até que gostaríamos de continuar recebendo o apoio daquele pai, mas o protocolo não permite que alm das vítimas e dos socorristas, mais ninguém fique no interior da ambulância. E enquanto eu fechava a porta da viatura e passava aquele senhor aos cuidados de outra ambulância no local, pela fresta da janela ainda pude observa seus olhos que se dividiam por entre a apreensão e o agradecimento. Logo a ambulância iniciou o deslocamento e rumamos ao hospital mais próximo. Em pouco tempo já encontrávamos dentro do Pronto Socorro com mãe e filha sendo atendidas pela equipe médica. Assim terminava mais um dos rotineiros socorros conduzidos por minha equipe. Agora só restava retornar ao local do acidente para verificar se aquele senhor havia sido atendido por outra ambulância e recolher os dados sobre todo o ocorrido para a confecção dos documentos. No local, percorri por todo o cenário perguntando a terceiros sobre aquele senhor. Ainda usava a cor de sua roupa para tentar facilitar a identificação, mas as respostas eram sempre as mesmas. ____ Não! Não vi este senhor por aqui. Fui aos Bombeiros saber sobre o pai que havias nos ajudado e deveria ter sido socorrido por eles. Foi ali que uma das grandes surpresas nos tomou conta. O bombeiro que gentilmente nos atendeu foi claro com a resposta. ___ Foi morte instantânea! Ele não teve chance. No capotamento, o carro caiu sobre ele e o amputou da cintura para baixo. O corpo esta ali coberto com aquela lona preta.
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